quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

The book is on the table


            Esta semana, meus filhos retornam às aulas. Vão enfrentar uma situação que está posta no Brasil há décadas e que, junto a várias outras mazelas da nossa educação, é igualmente vexatória: eles vão ter que assistir a aulas de inglês no colégio. De imediato, você poderia achar que fui acometido pela doença do antiamericanismo tão vigente na década de 70. Apresso-me logo a explicar que não é isso. O que os meus filhos vão vivenciar ao longo deste ano letivo, junto com vários outros colegas, é o mesmo que eu vivenciei, como aluno, 40 anos atrás e o que eu vivi, como professor, há mais de 30 anos. Inglês, ou qualquer outra língua estrangeira, da forma que é ensinada no colégio é absoluta perda de tempo. Haveria formas de modificar o ensino da língua estrangeira, sim, mas acho que ao longo das últimas décadas, quem regula a educação no nosso país, a galera do MEC e outras tantas instituições públicas subordinadas ao ministério, são, provavelmente, analfabetos em outra língua que não o português ou são ingênuos o suficiente para achar que no colégio, da forma que é ensinado, o aluno consegue mesmo aprender inglês ou outra língua estrangeira. Tirando essas duas opções, só falta mesmo colocar a burrice e a incompetência de quem dá as diretrizes do ensino no Brasil.

         Para que eu me faça claro, vou tomar o exemplo do meu filho Rafael. Ele vai estar numa turma em que o professor vai falar do Present Perfect e explicar que é passado, imprimir textos, alertando para as cascas de banana que os examinadores colocam nas provas. Os examinadores, quando elaboram uma prova de Inglês, adoram utilizar a babaquice dos falsos cognatos. O falso cognato é quando, no texto, aparece uma palavra como “actually” e o examinador coloca logo na  primeira alternativa a tradução “atualmente”. Actually significa “na verdade”. Ou seja, o examinador está brincando de testar o conhecimento do aluno na lígua estrangeira.  A verdade é que Rafael, estudando inglês desde os 10 anos de idade, tendo feito intercâmbio e com o grau de proficiência em inglês por Cambridge não vai conseguir extrair nada de novo da aula de inglês do colégio dele. E eu não culpo o colégio nem o professor. Eu culpo o sistema que o obriga a assistir a aula de inglês quando ele poderia estar na biblioteca estudando qualquer outra coisa ou, simplesmente, lendo um bom livro. Ele poderia até estar lendo um livro em inglês, como tarefa dada pelo seu próprio professor. Obrigar Rafael a assistir a uma aula de inglês no colégio poderia ter várias comparações.  A mais óbvia, e que há muito tempo já foi corrigida: quem é atleta pelo colégio, está naturalmente, obviamente, logicamente, dispensado da aula de educação física. Nem sei se ainda é assim. Mas, imagine o atleta de alta performance fazendo aula de educação física junto com a geração videogame/internet de hoje. Mas, os homens públicos, recusam-se a parar uma horinha para pensar no ensino da língua estrangeira. Quem sabe a língua em um nível superior, e assiste a uma aula nos moldes que é ministrada no ensino médio, tem a sensação de que está perdendo um tempo precioso. Especialmente quem vai fazer o ENEM, essa ópera bufa que o MEC impõe aos estudantes todo ano. A ideia do ENEM, com a teoria de resposta ao item, é boa, muito boa. Mas, a sua aplicação... Vocês têm acompanhado os casos absurdos na correção das redações.

         Sabe quantas horas, aproximadamente, Rafael desperdiçará este ano, assistindo a uma aula que em nada acrescentará a ele? Aproximadamente 60 horas. O pior de tudo isso é que não será um ócio prazeroso, nem o tão decantado ócio criativo. Será um ócio chato. É uma coisa mais ou menos assim: digamos que você tenha se formado em Matemática e seja obrigado a assistir a uma aula em que o professor vai explicar soma e subtração. Eu estou exagerando? Ok, então vamos aumentar o grau de dificuldade...O professor vai explicar equação de primeiro grau. E você vai ter que ouvir ele explicar isso por 45 minutos. E você já é formado em Matemática. Saco. Ou, digamos que você tenha se graduado em História e vai ouvir o seu professor dizer que Dom Pedro I foi o primeiro imperador do Brasil, que Deodoro da Fonseca proclamou a República e que a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea. Sentiu o drama?

         Mas a galera que comanda a educação nesse nosso Brasil não acha nada demais nisso. Provavelmente, se eles lessem esse texto iriam dizer: “Ora, eu tenho coisa mais importante pra pensar...” “Esse cara mima o filho com curso de inglês e intercâmbio, quer mais o quê? Ele é um caso pontual, não faz parte do universo macro que temos que pensar.” A educação não é  levada a sério no Brasil e o pior é que isso não é novidade para ninguém. Essa questão da aula de inglês parece ser apenas um detalhe em meio aos imensos desafios que a educação precisa vencer no país. Mas é um detalhe tão bobo que poderia ser resolvido com meio quilo de bom senso. Mas, bom senso é uma mercadoria em falta por aqui há muito tempo.

         Boa sorte, Rafa, e não esqueça: The book is on the table.