sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Superficial

Chega um tempo na vida em que somos quase, tão somente, reflexões. Constantemente divagamos sobre como seria a nossa vida se, em momentos decisivos, tivéssemos seguido por outro caminho que não o que optamos. É aí onde sempre surge a pergunta:  “será que fiz a escolha certa?” Na maioria das vezes, não há uma resposta, uma escolha certa. Nós vivemos a vida da forma que ela aconteceu. Teríamos sido felizes ou infelizes? Depende da sua própria percepção. Quanto mais complexos somos, mais facilmente nos achamos infelizes. Aliás, isso é parte do pedantismo de nos acharmos mais complexos que o cara do nosso lado. Puro e simples pedantismo.

A verdade é que nós não nos pertecemos. Mas, até que ponto isso é ruim? Se pertencêssemos apenas a nós mesmos, seria, muito provavelmente, a liberdade materializada. Mas, haveria sentido? Para alguns, talvez sim.  Para mim, acho que não.

No sábado, saí para almoçar em família. Meus filhos e suas namoradas, minha filha e minha mulher. De manhã, eu já tinha levado meu filho mais novo no espanhol, passado na padaria, voltado para casa, saído novamente para apanhá-lo no espanhol, voltado pra casa. Pausa. Passar um pouco de tempo, tomar banho, apanhar a namorada do outro filho, ir para o restaurante, almoçar...Você já deve ter cansado do meu sábado que apenas chegou à metade. Um sábado corriqueiro. Um sábado daqueles que as pessoas “mais cabeça” acham simplesmente enfadonho, desinteressante, sem graça, brega mesmo. Mas, se você chegou ao mesmo momento da linha do tempo que eu, em que as reflexões ocupam mais de sua vida, considere a possibilidade contrária. Você poderia simplesmente ter acordado e não ter tido ninguém para levar em canto nenhum. Esqueça a padaria. Esqueça o almoço, os filhos, as noras, a filha e a mulher. Considere a possibilidade de, sozinho, ver o tempo passar,  o dia se esvaindo pela janela. Ou, alguns anos mais pra frente, você acordar e ter a certeza de que ninguém vai mais precisar de você ou, pior, ninguém vai mais passar para ver você. Que o seu telefone não vai tocar. Que não há mais ninguém em sua vida, simplesmente porque você optou por não pertencer a ninguém além de a si próprio. Legal...Você manda na sua vida, ninguém diz o que você deve fazer, você não deve satisfações a ninguém, não tem que ajudar ninguém, não tem que atender telefone de ninguém, não tem que sair com ninguém. É aí que você faz uma daquelas reflexões tão profundas quanto um buraco negro: eu estou só. E, ainda assim, poderá chegar a duas conclusões: 1 - Era exatamente isso que eu sempre quis. Ou, 2 - Fodeu. Estou completamente só. E agora?

Já falei aqui que o tempo tem sido responsável por me tornar superficial. Expulsei Buñuels, Bergmans, Pasolinis e Fellinis da minha vida. Expulsei as leituras pesadas, tratados de sociologia ou economia. Não quero saber de Adam Simth, Samuelson ou Keynes. Freud não me interessa mais. Demoro séculos em livros fáceis. O mais pesado a que eu me permito assistir, hoje, é um Almodovarzinho. Ora, não me deem porrada. Até Woody Allen se superficializou. E, ao se superficializar, tornou-se menos hermético e menos chato. E você, superintelectual, deve estar pensando – “ele considera Allen hermético, hahahaha” Aqui está uma das vantagens da idade – você dá menos importância ao que as pessoas pensam de você. Por que eu tenho que assistir a um filme chato e profundo? Não tenho, mesmo.

Já anseio pelo próximo sábado em que acordarei meu filho às 7 da manhã para levá-lo ao espanhol. Depois vou passar na padaria, voltar, tomar café, apanhar minha filha, voltar, apanhar meu filho no espanhol, o outro filho acordou, levá-lo na casa da namorada, voltar, quem sabe almoçarmos juntos outra vez. À noite, vou esperar, contando os minutos, pelo momento em que todos estarão em casa novamente.

Como eu gosto de ser assim tão superficial.